quarta-feira, 29 de maio de 2013

Quese 3 mil trabalhadores regatados do Trabalho escravo em 2012


Números divulgados nesta segunda-feira (13) pela Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae), órgão do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), indicam que no Brasil 2.750 trabalhadores foram encontrados em condições análogas às de escravo no ano de 2012. As constatações decorreram de 255 ações de fiscalização, ao todo, realizadas pelo MTE. O total representa aumento de 14,3% na quantidade de casos de escravidão contemporânea no ano de 2011, quando houve o flagrante de 2.491 vítimas. O ano passado também superou a marca de 2010, que contabilizou 2.628 pessoas.

Homem trabalhava em condições degradantes, na produção de carvão vegetal (Fotos: MTE)

Para autoridades engajadas no combate à escravidão, a quantidade de resgatados em 2012 coincide com certa regularidade nos resultados das ações de fiscalização nos últimos cinco anos, mas pode indicar também uma mudança nas características dos casos. “Hoje, a gente não pode entender a quantidade de vítimas sem se debruçar mais sobre os números. Pode estar acontecendo uma redução significativa ou pode também estar acontecendo uma mudança no perfil com uma ‘sofisticação’ dos casos de trabalho escravo”, ressalta José Guerra, coordenador da Comissão Nacional de Combate ao Trabalho Escravo (Conatrae) e integrante da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR).
Segundo o membro da Conatrae, a partir de 2007 (veja os números desde 2007 no gráfico abaixo), ano em que 5.999 pessoas foram libertadas, houve uma redução significativa na quantidade de vítimas resgatadas mesmo com o aprimoramento das estruturas de combate e prevenção ao trabalho escravo. “Temos de saber o que isso significa, se é uma redução absoluta no período ou se pode indicar a necessidade de mudanças nas formas de fiscalização”, ressalta.
“O importante é observar o número de pessoas resgatadas em relação à quantidade de fiscalizações”, considera o coordenador do Projeto de Combate ao Trabalho Escravo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, Luís Machado. “É possível perceber uma mudança principalmente no meio rural, onde o foco das situações de trabalho escravo não mais está associado à restrição de liberdade, mas aparece nas condições degradantes ou na jornada exaustiva de serviço”, explica. O representante da OIT atribui essa alteração no cenário aos quase 18 anos de combate à escravidão. As ações de inspeção sobre a escravidão contemporânea no país começaram em 1995.
Libertação recorde
A Detrae também dá destaque, no levantamento sobre o ano de 2012, à libertação de 150 trabalhadores de condições análogas às de escravo durante uma fiscalização na região de Marabá, no Pará. Essa foi a ação fiscal em que mais pessoas foram resgatadas no ano passado. O Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo encontrou não apenas pessoas submetidas à escravidão na produção de carvão vegetal, como também crimes ambientais e emissão de notas fiscais falsas. Na ocasião, a equipe formada por auditores fiscais do MTE, procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Polícia Rodoviária Federal (PRF), relatou até ameaças de morte.

Riacho de onde grupo de libertados retirava água para beber, em Goianésia, no Pará

Os 150 resgatados estavam em condições degradantes, trabalhando em 185 fornos irregulares em duas carvoarias, em local isolado de difícil acesso em Goianésia do Pará, a cerca de 185km de Marabá. O caso levou a Siderúrgica do Pará (Sidepar), que, de acordo com a fiscalização, estaria interceptando a produção de carvão realizada com trabalho escravo junto das siderúrgicas Cosipar e Ibérica, a ser suspensa do Pacto Nacional Pela Erradicação do Trabalho Escravo – acordo que reúne algumas das principais empresas do país.
*Matéria atualizada às 17h55 do dia 27 de maio para alterar informações. O MTE havia informado originalmente a quantia de 2.849 pessoas flagradas na escravidão contemporânea em 2012; na verdade, foram 2.750.

Ações de combate e prevenção ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo são reunidas em publicação

O caderno “Experiências Comunitárias de Combate à Escravidão” divulga 15 ações de defesa dos direitos fundamentais apoiadas pelo programa



O programa Escravo, nem pensar!, com o apoio da Catholic Relief Service (CRS), Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e TAM Linhas Aéreas lançou no mês de maio o caderno “Experiências Comunitárias de Combate à Escravidão”. A publicação reúne 15 ações realizadas por professores, lideranças comunitárias e agentes pastorais de combate e prevenção ao tráfico de pessoas e ao trabalho escravo apoiadas pelo Fundo de Apoio a Projetos do Escravo, nem pensar!.

Além de destacar os projetos realizados 

em 2012, a publicação busca inspirar novas ações

Entre os meses de junho e novembro de 2012, os projetos promoveram diferentes atividades para sensibilizar, conscientizar e erradicar o trabalho escravo e o tráfico de pessoas. Houve produção de poemas, textos e paródias; apresentações de dança, capoeira, teatro e música; confecção de cartazes, panfletos e banners; rodas de conversa e exibição de filmes; produção de hortas comunitárias; pesquisas sobre a cultura quilombola e migração.
“A gente se sente fazendo algo a mais pelos outros. Imagina quantas pessoas a gente não está tirando desse ciclo do trabalho escravo? A gente sempre deixa claro que as pessoas têm o direito de migrar livremente, mas a questão é saber pra onde vão, com quem vão, como é o trabalho. É muito importante esse trabalho de informar. (...)Foi uma grande conquista para população que conseguiu ter acesso” relatou Francisco José dos Santos Oliveira, coordenador do projeto “A arte na prevenção ao trabalho escravo” realizado no Assentamento Nova Conquista no município de Monsenhor Gil (PI).
Cada iniciativa recebeu até R$ 1,2 mil e acompanhamento pedagógico mensal da equipe do programa para subsidiar as atividades. Um dos objetivos do Fundo de Apoio a Projetos do Escravo, nem pensar! é promover o protagonismo e engajamento de professores, lideranças comunitárias e agentes pastorais no combate e prevenção ao trabalho escravo. Desde 2007, 80 projetos já foram apoiados pela ONG Repórter Brasil. Clique aqui para ver projetos de edições passadas.

Homem esteve preso a condições degradantes durante quase uma década


Homem esteve preso a condições degradantes durante quase uma década. Flagrado com armas e acusado de ameaças, fazendeiro nega superexploração

Por Guilherme Zocchio | Categoria(s): Notícias

Durante quase 10 de seus 49 anos de vida, Joaquim Eduardo* permaneceu alojado nos fundos de uma propriedade rural, em Dourados, no Mato Grosso do Sul (MS). Isolado, ele não dispunha, por lá, de água potável ou qualquer outra forma de abastecimento. Para matar a sede, tomar banho ou realizar necessidades, nesse período, deveria caminhar até um açude próximo, desde que o poço caipira que cavara quando começou a trabalhar no local, no final de 2003, secou. Os mantimentos, a cada dez ou quinze dias, eram trazidos pelo empregador, dono de três fazendas no distrito de Itahum. Basicamente, arroz, macarrão, um pouco de carne e feijão compunham a dieta do trabalhador.
Janela na cozinha de alojamento que era usado como residência (Fotos: MPT)
Janela na cozinha de alojamento que, segundo inspeção, era usado como residência (Fotos: MPT)
Fiscais do Ministério Público do Trabalho (MPT) e do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), junto de agentes da Polícia Federal (PF) e do Departamento de Operações de Fronteira (DOF-MS) verificaram a situação à qual viveu submetido o trabalhador, de novembro de 2003 até o último dia 23 de abril. Após uma denúncia anônima, ele foi resgatado. “Recebemos a denúncia no mesmo dia. Ficamos preocupados com o teor, e, logo à tarde, já estávamos na região para apurar o ocorrido”, explica o procurador do MPT Jeferson Pereira.
Em condições análogas às de um escravo, conforme constatou a fiscalização, Joaquim havia sido contratado para trabalhar como capataz de Paulo Afonso Lima Lange, pecuarista dono de 1.500 cabeças de gado, empresário criador de cavalos da raça crioulo e proprietário de um conjunto de três fazendas na região que carregam a alcunha de São Lourenço. Era o único empregado registrado no empreendimento, de acordo com os fiscais. A promessa original que recebera era a de condições dignas de serviço e um salário mínimo, capaz de ajudar no sustento da família, esposa e duas crianças que nasceram no decorrer desses quase dez anos de escravidão. Mesmo com carteira assinada e o recolhimento regular para o FGTS, sua remuneração, porém, mal passava de R$300,00 mensais.
“Apesar de ter sido contratado e estar registrado como capataz, ele fazia de tudo um pouco. Cuidava do gado, batia e preparava a ração dos animais”, descreve a auditora fiscal do MTE que participou da fiscalização, Patrícia Verdini. Segundo ela apurou, além de estar sujeito a um ambiente degradante e alojado em local que caracterizava isolamento geográfico, Joaquim cumpria jornadas que se estendiam por períodos superiores a 12 horas diárias e não recebia os devidos equipamentos para a sua proteção durante o serviço, os chamados EPIs.
“Eu cuidava das três fazendas. Fazia a cerca, mexia com o trator. Fazia de tudo. Era o único peão. Pegava de madrugada e ia até oito horas da noite. Direto, direto, direto. Sem feriado. E até de Sexta-feira Santa”, lembra o trabalhador sobre as circunstâncias de seu serviço, em entrevista à Repórter Brasil.
Recipiente armazena água que era retirada de um açude próximo

Pela jornada de serviço excessiva, que não lhe permitia o zelo necessário à família, e ausência de condições dignas de habitação e higiene, Joaquim perdeu, depois de três anos na fazenda, a guarda das duas filhas, que passaram, por sua vez, a morar com a avó em Dourados. A esposa, igualmente sujeita à situação degradante, desenvolveu problemas psicológicos e, pela relação turbulenta e problemática que os dois começaram a levar, também deixou o local. “Sete anos passei sem ver minha mulher e meus filhos. E chorava de desgosto. Ficava sem ninguém, sem ter os filhos, sem ter água, sem ter nada”, conta o trabalhador. Os únicos contatos que tinha, conforme explica, eram com seu empregador ou com um “rapazinho” que dizia vim lhe visitar com alguma regularidade. “Só tinha contato com o patrão. Nem com o vigia ele deixava conversar. De vez em quando, conversava com um ‘rapazinho’ que morava lá perto”.
“Ele era encarregado de serviços gerais e contratado como capataz, mas não tinha como exercer essa função”, justifica, por um lado, o fazendeiro. Paulo Afonso alega que Joaquim sofria de alcoolismo. Por outro lado, o pecuarista afirma, então, que tentou aproximar o trabalhador de sua família, como modo de ajudá-lo a superar o problema com a bebida. “A gente foi tentando melhorar a cabeça do indivíduo, porque ele era meu funcionário. Você vai levando, tenta levar o rapaz para um bom caminho, mas tem gente que não se ajuda”, diz.
Armas e ameaças
De acordo com os fiscais, no entanto, foi possível constatar várias situações em que houve algum tipo de ameaça do latifundiário sobre Joaquim. “Não eram raras as vezes em que o empregador dizia que para matar ele [o trabalhador] e um boi era a mesma coisa”, aponta a auditora do MTE Patrícia Verdini. Na ocasião do flagrante de trabalho escravo, os agentes da Polícia Federal ainda encontraram uma pistola calibre 357, uma espingarda calibre 32, seis tipos de munição diferente e o silenciador de um revólver, todos os materiais sob posse do pecuarista, que não dispunha de autorização judicial para tê-los.
Interior da casa onde Joaquim viveu
Interior da casa onde a fiscalização constatou que Joaquim viveu durante seus anos de escravidão

Paulo Afonso foi preso por porte ilegal de armas na oportunidade da inspeção trabalhista. Dois dias depois, conseguiu liberdade provisória, mediante o pagamento de fiança de oito salários mínimos. No momento em que conversou com a Repórter Brasil já estava em liberdade. As munições e os outros armamentos permanecem apreendidos pelo DOF-MS.
O fazendeiro costumava caminhar armado e dar tiros para o alto enquanto estava na área de suas propriedades, segundo verificou a fiscalização. Para o Procurador Jeferson Pereira, as ameaças e o fato de o empregador andar com armas à mão provocavam em Joaquim “um temor reverencial pelo proprietário”. “Ele se sentia coagido a continuar trabalhando para o produtor rural. O trabalhador ficava com medo de abandonar o serviço, porque havia coação moral pela presença ostensiva de armas na fazenda”, define. Essa situação pode caracterizar o quadro de “trabalho forçado”, uma das tipificações de trabalho escravo contemporâneo prevista no Artigo 149 do Código Penal.
“De vez em quando ele falava: você não pode sair de mim, não vai embora não”, relembra Joaquim das vezes em que perguntou a seu patrão a respeito de uma possível mudança de emprego. O resgatado também expõe que, sem importar hora, data ou local, sentia-se constantemente vigiado. “Ele sabia todos os meus passos. O telefone tocava dia e noite, atrás de mim. Nunca cheguei a procurar outro trabalho. Eu tinha medo de sair”, conta. Questionado por esta reportagem se nunca sentiu vontade ou se alguma vez tentou fugir da fazenda, ele responde: “cheguei”. “Mas tinha medo de ele [o pecuarista] fazer alguma coisa comigo lá no fundo da fazenda. Então pensei: quem sabe deus ajuda. E resolvi ficar”.
Por sua vez, o empregador alega que uma vez tentou despedir seu empregado e, nas suas palavras, reitera que Joaquim “implorou para não ir embora”. O pecuarista diz que mantinha uma relação amistosa com seu funcionário e que até seu filho tratava-o “como um amigo”.
Sem água, banheiro não apresentava condições de higiene
 Sem água, banheiro não apresentava condições de higiene

Rescisão com dinheiro da JBS
O fim do processo de resgate do trabalhador, pelo encerramento da rescisão contratual, aconteceu na última quarta-feira (15), com a entrega das verbas às quais tinha direito devido ao não recebimento de parcelas de seu salário, nesses quase 10 anos em que se manteve na fazenda de Paulo Afonso. Pelo valor da quantia e por problemas no Cadastro de Pessoa Física (CPF) de Joaquim, o procedimento rescisório não foi encerrado antes da última semana. Nesse período, os procuradores do MPT responsáveis pelo caso, bem como os auditores fiscais do MTE, acompanharam todo o desenrolar. Ao todo, foram lavrados sete autos de infração.
O resgatado recebeu R$25.360,97, pagos em juízo pelo grupo JBS devido à venda de 20 cabeças de gado bovino da criação do fazendeiro para a empresa. O dinheiro a priori pago a Paulo Afonso pela venda dos animais foi usado para custear as verbas rescisórias. Em posicionamento à reportagem, a companhia assume que havia comprado esse lote porque nunca constatou o histórico do uso de mão de obra análoga à de escravo na produção do pecuarista.
“Como o nome do fazendeiro não consta na ‘lista suja’ do trabalho escravo, a JBS de fato recebeu o lote de 20 bois fornecidos pelo produtor. Diante do ocorrido, a empresa pagou o valor em juízo e deixou a cargo dos órgãos responsáveis a maneira pela qual o dinheiro será encaminhado”, afirma em nota a empresa. A “lista suja” é o nome pelo qual é conhecida a relação de empresas e pessoas flagradas empregando escravos, mantida pelo Ministério do Trabalho e Emprego e pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos. A JBS é signatária do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, grupo que se compromete a não comprar de quem está no cadastro, mas foi suspensa em 2012.
Carne que viria do abate de animais pelo próprio trabalhador
Carne que viria do abate de animais pelo próprio trabalhador

Joaquim já conseguiu um novo emprego, sobre o qual ele próprio diz que “está muito feliz”. Trabalha agora regularmente, e a pouco mais de 800 metros da sua casa, onde voltou a viver com a esposa e as filhas, em Dourados, depois do período que passaram separados. A reportagem perguntou-lhe se, alguma vez, já havia ouvido falar em trabalho escravo. A resposta foi afirmativa. “Já tinha. Sempre que assistia à televisão toda noite, via o cara pesando. Eu falava que uma hora o povo vai denunciar esse patrão. Pensava: uma hora esse velho tá lascado, e é preso ainda!”.
Em entrevista, o pecuarista minimizou a situação a que o trabalhador estava submetido. Apesar disso, firmou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o MPT, no qual se compromete a observar exigências trabalhistas, não reduzir pessoas à escravidão e de bancar uma campanha publicitária para a prevenção do aliciamento de pessoas ao trabalho escravo. No caso de não cumprimento deverá pagar multa a partir de R$ 10 mil. “Eu me criei hasteando a bandeira e cantando o hino nacional. Na minha família não tem bandido, nem escravagista. Você tenta ajudar o indivíduo, torná-lo uma boa pessoa, mas não dá”, encerra.
*o nome foi trocado para preservar a identidade da vítima

"A carne de Cristo está na carne dos refugiados"





Na audiência concedida ao Dicastério para os Migrantes, o Papa denuncia vigorosamente o tráfico de seres humanos e convida cada um a dar a própria contribuição para as pessoas erradicadas à força. 

  Salvatore Cernuzio

ROMA, 24 de Maio de 2013 (Zenit.org) - "Uma atividade ignóbil, uma vergonha para as nossas sociedades que se dizem civilizadas". Não existem outras palavras para descrever o fenômeno do “tráfico de pessoas”, segundo o Papa Francisco. O Pontífice não mede palavras à denúncia desta chaga que destrói a “carne de Cristo” e, na Audiência de hoje aos participantes da Plenária do Pontifício Conselho da Pastoral dos Migrantes e Itinerantes, afirma: “Exploradores e clientes em todos os níveis deveriam fazer um sério exame de consciência diante de si mesmos e diante de Deus”. Ao mesmo tempo, renova o forte apelo da Igreja “para que sejam sempre protegidas a dignidade e a centralidade de toda pessoa, no respeito dos direitos fundamentais”.

A reflexão cheia de indignação do Santo Padre parte da análise do Documento do Dicastério, que “chama a atenção sobre milhões de refugiados, emigrados e apátridas, tocando também a chaga do tráfico de seres humanos, que sempre cada vez mais envolvem crianças, nas piores formas de exploração e recrutados até mesmo nos conflitos armados”.

"Em um mundo onde se fala muito de direitos - diz o Papa - quantas vezes é realmente pisada à dignidade humana!" O dinheiro, no entanto, parece ser o único a ter direitos, porque ele está no controle do mundo de hoje. "Nós - observa com tristeza - vivemos em um mundo, em uma cultura onde impera o fetichismo do dinheiro".

Portanto, Francisco incentiva o Pontifício Conselho "a continuar no caminho do serviço aos irmãos mais pobres e marginalizados", recordando as palavras de Paulo VI no encerramento do Concílio Vaticano II (8 de dezembro de 1965): "Para a Igreja Católica ninguém é um estranho, ninguém é excluído, ninguém está longe".

"De fato somos uma só família humana” comenta o sucessor de Pedro, e “a atenção materna” da Igreja se manifesta “com especial ternura e proximidade com as pessoas forçadas a fugir do próprio país e vive entre desarraigamento e integração”. “A compaixão cristã – acrescenta – este ‘sofrer com’, se expressa antes de mais nada no compromisso de conhecer os eventos que levam a deixar à força a Pátria e, onde é necessário, no dar voz a quem não consegue fazer que se escute o grito de dor e de opressão”.

Neste sentido, o Departamento de Migrantes desenvolve "uma tarefa importante também no sensibilizar as Comunidades cristãs com os irmãos marcados pelas feridas que marcam a sua existência”. Feridas assim tão grandes que não podem ser nem sequer listadas. O Papa nomeia algumas delas: "Violência, abusos de poder, distância da família, eventos traumáticos, fuga da casa, incerteza sobre o futuro em campos de refugiados". Todos os elementos, diz ele, "que desumanizam e devem levar cada cristão e toda a comunidade a uma atenção concreta”.
No entanto, ainda no meio da podridão existe algo que brilha: é “a luz da esperança” que o Sucessor de Pedro convida “a captar nos olhos e no coração dos refugiados e das pessoas erradicas à força”. Esta esperança, “se expressa nas expectativas pelo futuro, na vontade de relações de amizade, no desejo de participar da sociedade que as acolhe, também por meio do aprendizado da língua, do acesso ao trabalho e a educação para as crianças”. Confessa Bergoglio: “Admiro a coragem de quem espera poder gradualmente retomar a vida normal na esperança de que a alegria e o amor voltem a alegrar a sua existência”.

Todos, portanto, "podemos e devemos alimentar essa esperança!" Especialmente aqueles que têm o poder de fazê-lo: governadores, legisladores, a Comunidade Internacional. O Papa exorta-os de fato a colocar em ato “iniciativas e novas abordagens” para tutelar a dignidade dos migrantes diante destas “formas modernas de perseguição, opressão e escravidão”.

"São pessoas humanas", insiste; seres humanos "que precisam de urgente ajuda, mas também e principalmente de compreensão e de bondade". A sua condição, portanto, "não pode deixar indiferentes". Um apelo, portanto, vai também a cada Pastor e Comunidade cristã, que – diz Bergoglio – devem ter especial cuidado do “caminho de fé dos cristãos refugiados e erradicados à força”, por meio de uma pastoral “que respeite as suas tradições e os acompanhe a uma harmoniosa integração nas realidades eclesiais em que vivem”.

O Papa conclui: "Queridos amigos, não se esqueçam da carne de Cristo que está na carne dos refugiados". Em virtude disso, torna-se urgente a responsabilidade do Dicastério de “orientar para novas formas de corresponsabilidade todos os Organismos comprometidos no campo das migrações forçadas”, a fim de “promover respostas concretas de proximidade e de acompanhamento das pessoas, tendo em conta as diversas situações locais”.