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segunda-feira, 27 de agosto de 2012
Libertados de madeireira dormiam em meio ao lixo
10/08/2012 - 21:45
Por Guilherme Zocchio
Os 13 trabalhadores libertados de uma serraria em Maranhãozinho (MA) dormiam em meio a um monte de lixo. O repouso norturno diário se dava entre ferramentas cortantes, serras circulares desprotegidas, barris de combustível, restos de serragem, garrafas vazias e pedaços de madeira. A condição degradante do alojamento era complementada pelo total descaso quanto à saúde e segurança do trabalho, como a falta de equipamentos de proteção individual (EPIs), além da ausência de carteira assinada e de uma série de outros direitos trabalhistas assegurados por lei.
Eles foram resgatados de condições análogas à escravidão em uma madeireira conhecida como Serraria do Joelzão, em fiscalização ocorrida entre os dias 6 e 15 de junho. A operação foi coordenada pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Maranhão (SRTE/MA).
Ao
todo, 41 funcionários trabalhavam na empresa — nenhum deles com
carteira de trabalho assinada. Do total, 17 deles residiam na
propriedade, porque vinham de Buriticupu (MA), a cerca de 300 km do
local. Contratado para fazer a extração e o beneficiamento de madeira,
apenas o grupo de 13 trabalhadores libertados, no entanto, encontrava-se
em situação de escravidão.
O local de alojamento deles estava em péssimas condições. Não havia banheiro disponível, o que fazia com que os 13 empregados realizassem as necessidades fisiológicas nas redondezas. O piso não era completamente vedado; com isso, existia o risco da entrada de animais peçonhentos. A fiação elétrica estava exposta. Um fogão a gás funcionava no recinto, que era todo construído em madeira. Além disso, não havia extintores, mesmo com a alta possibilidade de incêndio, segundo relata a SRTE/MA à Repórter Brasil.
Apesar das condições precárias, os trabalhadores recebiam o salário em dia. Para o procurador do trabalho Maurel Selares, que participou da inspeção com o grupo móvel de fiscalização junto com integrantes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e da Polícia Federal (PF), o pagamento ajudava a esconder as condições degradantes e desumanas de trabalho. “O empregador economizava por um lado, ao não garantir as obrigações trabalhistas, e pagava bem por outro. Pagava o salário em dia e um salário bom para a região. O trabalhador que estava lá não consegue um salário desses”, detalha Maurel.
De acordo com ele, os trabalhadores recebiam até uma quantia em torno de R$ 1,5 mil e R$ 2 mil mensais. A média salarial em Maranhãozinho (MA) gira em torno de R$ 815,00, conforme o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Não havia irregularidades com o pagamento dos trabalhadores. O resgate se efetivou por força das condições degradantes no ambiente de trabalho”, reforça Carlos Henrique da Silveira Oliveira, auditor fiscal do trabalho que coordenou a fiscalização na madeireira.
Esses salários, contudo, não acompanhavam a garantia de outros direitos. “Os trabalhadores não tinham férias, 13º salário, nenhum direito trabalhista. Quem não conhece seus direitos acha às vezes que só o salário bom já basta”, pondera Maurel, da Procuradoria do Trabalho da 16ª região (PRT-16). Com a falta de EPIs, por exemplo, alguns deles eram obrigados a trabalhar de sandálias ou botinas rasgadas. Além disso, tinham de dividir um mesmo copo improvisado com garrafa PET quando queriam beber água —que vinha direto de uma torneira sem passar por filtração ou outro tipo de tratamento.
Dos
quatro outros empregados que residiam na propriedade, dois cuidavam dos
assuntos administrativos da empresa, e outros dois não foram
localizados posteriormente, mas nenhum deles estava trabalhando em
situação degradante. “Tinha um outro alojamento em boas condições, de
acordo com o MTE, onde ficavam os gerentes”, diz o procurador Maurel.
Foi a partir de uma denúncia vinda do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) que a SRTE/MA iniciou a investigação da madeireira. Um funcionário procurou o INSS enquanto estava doente, mas, como não tinha carteira assinada, não pôde ser atendido. Com isso, a fiscalização passou a investigar o caso até que chegou ao empreendimento em Maranhãozinho (MA).
Empregador
Joel Amelia de França, dono da Serraria do Joelzão, teve que arcar com um total de R$ 55 mil pelos custos de rescisão contratual e com a quantia de R$ 50 mil por danos morais coletivos - a qual deve ser enviada até o mês que vem para alguma entidade assistencial do município.
O proprietário também assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) perante o MPT comprometendo-se a não utilizar mais de trabalho em situação degradante. Ao todo, foram lavrados 19 autos de infração.
Os
13 empregados libertados receberam, em 12 de junho, as verbas e o
requerimento de Seguro-Desemprego para Trabalhador Resgatado, na
representação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em Santa Inês
(MA). Após isso, eles foram alertados para evitarem outras atividades
que os tornem vítimas de trabalho degradante e orientados a denunciar
ao MTE qualquer outra tentativa de aliciamento à escravidão
contemporânea.
Em 2009, Joel acumulou outros três autos de infração por crimes ambientais e duas notificações no Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Entre as infrações, estavam a posse ilegal de madeira em toras e depósitos para a produção de carvão vegetal, além de falta de licença. Em 2010, foi notificado a apresentar a autorização para o funcionamento de seu negócio, fato que se repetiu em 2012.
repórter brasil .
Libertados de madeireira dormiam em meio ao lixo
Empregados estavam alojados em local sujo, perigoso e sem banheiro. Eles não tinham carteira assinada e enfrentavam graves riscos à saúde e segurança.Por Guilherme Zocchio
Os 13 trabalhadores libertados de uma serraria em Maranhãozinho (MA) dormiam em meio a um monte de lixo. O repouso norturno diário se dava entre ferramentas cortantes, serras circulares desprotegidas, barris de combustível, restos de serragem, garrafas vazias e pedaços de madeira. A condição degradante do alojamento era complementada pelo total descaso quanto à saúde e segurança do trabalho, como a falta de equipamentos de proteção individual (EPIs), além da ausência de carteira assinada e de uma série de outros direitos trabalhistas assegurados por lei.
Eles foram resgatados de condições análogas à escravidão em uma madeireira conhecida como Serraria do Joelzão, em fiscalização ocorrida entre os dias 6 e 15 de junho. A operação foi coordenada pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Maranhão (SRTE/MA).
Parte externa do local onde os 13 escravos estavam residindo na madeireira (fotos: SRTE/MA) |
O local de alojamento deles estava em péssimas condições. Não havia banheiro disponível, o que fazia com que os 13 empregados realizassem as necessidades fisiológicas nas redondezas. O piso não era completamente vedado; com isso, existia o risco da entrada de animais peçonhentos. A fiação elétrica estava exposta. Um fogão a gás funcionava no recinto, que era todo construído em madeira. Além disso, não havia extintores, mesmo com a alta possibilidade de incêndio, segundo relata a SRTE/MA à Repórter Brasil.
Interior de alojamento onde estavam os 13 libertados; no chão: madeira e serragem, ferramentas e latas de combustível |
Apesar das condições precárias, os trabalhadores recebiam o salário em dia. Para o procurador do trabalho Maurel Selares, que participou da inspeção com o grupo móvel de fiscalização junto com integrantes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e da Polícia Federal (PF), o pagamento ajudava a esconder as condições degradantes e desumanas de trabalho. “O empregador economizava por um lado, ao não garantir as obrigações trabalhistas, e pagava bem por outro. Pagava o salário em dia e um salário bom para a região. O trabalhador que estava lá não consegue um salário desses”, detalha Maurel.
De acordo com ele, os trabalhadores recebiam até uma quantia em torno de R$ 1,5 mil e R$ 2 mil mensais. A média salarial em Maranhãozinho (MA) gira em torno de R$ 815,00, conforme o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Não havia irregularidades com o pagamento dos trabalhadores. O resgate se efetivou por força das condições degradantes no ambiente de trabalho”, reforça Carlos Henrique da Silveira Oliveira, auditor fiscal do trabalho que coordenou a fiscalização na madeireira.
Esses salários, contudo, não acompanhavam a garantia de outros direitos. “Os trabalhadores não tinham férias, 13º salário, nenhum direito trabalhista. Quem não conhece seus direitos acha às vezes que só o salário bom já basta”, pondera Maurel, da Procuradoria do Trabalho da 16ª região (PRT-16). Com a falta de EPIs, por exemplo, alguns deles eram obrigados a trabalhar de sandálias ou botinas rasgadas. Além disso, tinham de dividir um mesmo copo improvisado com garrafa PET quando queriam beber água —que vinha direto de uma torneira sem passar por filtração ou outro tipo de tratamento.
Torneira da qual o grupo de 13 funcionários bebia a água, em um copo coletivo feito com garrafa pet |
Foi a partir de uma denúncia vinda do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) que a SRTE/MA iniciou a investigação da madeireira. Um funcionário procurou o INSS enquanto estava doente, mas, como não tinha carteira assinada, não pôde ser atendido. Com isso, a fiscalização passou a investigar o caso até que chegou ao empreendimento em Maranhãozinho (MA).
Empregador
Joel Amelia de França, dono da Serraria do Joelzão, teve que arcar com um total de R$ 55 mil pelos custos de rescisão contratual e com a quantia de R$ 50 mil por danos morais coletivos - a qual deve ser enviada até o mês que vem para alguma entidade assistencial do município.
O proprietário também assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) perante o MPT comprometendo-se a não utilizar mais de trabalho em situação degradante. Ao todo, foram lavrados 19 autos de infração.
Na cozinha da empresa, os alimentos eram preparados em fogareiro de barro e lenha, com cães circulando pelo ambiente |
Em 2009, Joel acumulou outros três autos de infração por crimes ambientais e duas notificações no Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Entre as infrações, estavam a posse ilegal de madeira em toras e depósitos para a produção de carvão vegetal, além de falta de licença. Em 2010, foi notificado a apresentar a autorização para o funcionamento de seu negócio, fato que se repetiu em 2012.
repórter brasil .
Repórter Brasil publica livro que celebra 10 anos de estrada
Repórter Brasil lança coletânea com algumas das melhores reportagens veiculadas no site da organização, que acaba de completar sua primeira década de existência
LANÇAMENTO DO LIVRO
REPÓRTER BRASIL.
10 ANOS DE ESTRADA DE TERRA EM 1 7 GRANDE S REPORTAGENS
22 de agosto, 4a feira
19h30, Livraria Cultura do Conjunto Nacional
Avenida Paulista, 2073
LANÇAMENTO DO LIVRO
REPÓRTER BRASIL.
10 ANOS DE ESTRADA DE TERRA EM 1 7 GRANDE S REPORTAGENS
22 de agosto, 4a feira
19h30, Livraria Cultura do Conjunto Nacional
Avenida Paulista, 2073
A Repórter Brasil foi ao ar no dia 9 de outubro de
2001, com o objetivo de fomentar a reflexão e a ação sobre a violação
aos direitos dos povos e trabalhadores do campo no Brasil por meio da
informação de qualidade.
Com o tempo, tornou-se uma das mais importantes fontes de informação
sobre direitos humanos no país. As reportagens, investigações
jornalísticas, pesquisas e metodologias educacionais da Repórter Brasil
têm sido usadas por lideranças do poder público, do setor empresarial e
da sociedade civil como instrumentos de combate à escravidão
contemporânea, um problema que afeta milhares de pessoas.
Síntese do trabalho que a Repórter Brasil tem desenvolvido, a coletânea REPÓRTER BRASIL. 10 ANOS DE ESTRADA DE TERRA EM 17 GRANDES REPORTAGENS
traça um panorama ao mesmo tempo geográfico (foram escritos em
municípios de todas as regiões do país), cronólogico (cobrem pouco mais
de uma década) e temático (os assuntos vão da seca em estados do
Nordeste às condições de trabalho em confecções paulistanas, passando
por agricultura, mineração e infra-‐estrutura).
Iniciado na nascente do Capibaribe, na divisa entre Pernambuco e
Paraíba, onde trabalhadores levavam, em 2000, uma vida infelizmente
parecida com a dos retirantes retratados em Morte e Vida Severina, o
percurso do livro é, de certo modo, uma descoberta do Brasil, de suas
riquezas, de seus problemas, de sua gente.
O LIVRO
REPÓRTER BRASIL.
10 ANOS DE ESTRADA DE TERRA EM 17 GRANDES REPORTAGENS.
Organização de Leonardo Sakamoto e Lúcia Monteiro. Vários autores. 208 págs., R$ 36,90.
REPÓRTER BRASIL.
10 ANOS DE ESTRADA DE TERRA EM 17 GRANDES REPORTAGENS.
Organização de Leonardo Sakamoto e Lúcia Monteiro. Vários autores. 208 págs., R$ 36,90.
OS ORGANIZADORES
Leonardo Sakamoto é fundador da Repórter Brasil, da qual é coordenador. Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo, ele é professor do curso de jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e autor do Blog do Sakamoto (blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br).
Leonardo Sakamoto é fundador da Repórter Brasil, da qual é coordenador. Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo, ele é professor do curso de jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e autor do Blog do Sakamoto (blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br).
Lúcia Monteiro é jornalista, mestre em cinema e
membro associado da Repórter Brasil. Foi professora de cinema da
Universidade de Paris 3 Sorbonne Nouvelle e atualmente prepara sua tese
de doutorado na mesma instituição, em parceria com a Universidade de São
Paulo.
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