quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Ditadura matou 1.196 camponeses, mas Estado só reconhece 29

 
Financiada pelo latifúndio, a ditadura “terceirizou” prisões, torturas, mortes e desaparecimentos forçados de camponeses que se insurgiram contra o regime e contra as péssimas condições de trabalho no campo brasileiro. O resultado disso é uma enorme dificuldade de se comprovar a responsabilidade do Estado pelos crimes: 97,6% dos camponeses mortos e desparecidos na ditadura militar foram alijados da justiça de transição. “É uma exclusão brutal”, afirma o coordenador do Projeto Memória e Verdade da Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência, Gilney Viana, autor de estudo inédito sobre o tema.

O estudo revela que pelo menos 1.196 camponeses e apoiadores foram mortos ou desaparecidos do período pré-ditadura ao final da transição democrática (1961-1988). Entretanto, os familiares de apenas 51 dessas vítimas requereram reparações à Comissão de Anistia. E, destes, somente os de 29 tiveram seus direitos reconhecidos. Justamente os dos 29 que, além de camponeses, exerceram uma militância político-partidária forte, o que foi determinante para que fossem reconhecidos como anistiados. “Os camponeses também têm direito à memória, à verdade e à reparação”, defende Viana. 

Segundo ele, dentre as 1.196 mortos e desaparecidos no campo, o estudo conseguiu reunir informações sobre 602 novos casos excluídos da justiça de transição, suficientes para caracterizá-los como “graves atentados aos direitos humanos”. Esta caracterização é condição primordial para que sejam investigados pela Comissão Nacional da Verdade (CNV). Segundo Gilney, o objetivo é alterar o quadro atual e permitir que essas vítimas usufruam dos mesmos direitos dos militantes urbanos, estabelecidos pela Lei 9.140, de 4/12/1995, que reconheceu como mortos 136 desaparecidos e criou a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), com mandato para reconhecer outros casos e promover reparações aos familiares que assim o requererem.

As novas vítimas que poderão entrar para a lista oficial de mortos e desaparecidos políticos do país são 75 sindicalistas, 14 advogados, sete religiosos, 463 lideranças de lutas coletivas e 43 trabalhadores que tombaram em conflitos individuais. “Os dados revelam a ponta de um iceberg de um conjunto bem amplo de perseguidos políticos pela ditadura militar até agora pouco estudado”, acrescenta Viana. 

Terceirização dos crimes
Destes 602 casos, em apenas 25% é possível comprovar a efetivação de inquérito policial e, somente em 5%, desfecho judicial. Ainda assim, o estudo conseguiu comprovar a ação direta de agentes de estado em 131 casos, o que facilita o reconhecimento deles como vítimas da ditadura. O problema é que em 471, ou 85% dos casos, as evidências apontam para o fato de que os crimes foram cometidos por agentes privados, ainda que sob a anuência dos representantes da ditadura. 

“O Estado se omitiu, encobertou e terceirizou a repressão política e social no campo, executada por jagunços, pistoleiros, capangas e capatazes, a serviço de alguns fazendeiros, madeireiros, empresas rurais, grileiros e senhores de engenhos, castanhais e seringais. Esta hipótese explicativa principal é compatível com o papel importante que a classe dos latifundiários, fazendeiros, senhores de engenho, castanhais e seringais tiveram no golpe, na sustentação da ditadura e na coligação de forças políticas que fizeram a transição”, diz o estudo.

Apesar da dificuldade, Viana avalia que a CNV tem poderes para incluí-los no escopo de investigados. Segundo ele, o Art. 1º da Resolução nº 2, de 20/8, define que caberá ao órgão “examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas (...) por agentes públicos, pessoas a seu serviço, com apoio ou no interesse do Estado”. “Isso incluiu os crimes realizados pelos agentes do latifúndio em concurso com os da ditadura”, observa. 

Comissão Camponesa
Embora o estudo da SDH tenha sido concluído, as mortes e desaparecimentos dos demais camponeses já identificados pelo órgão continuarão sendo apuradas, agora pela Comissão Camponesa pela Anistia, Memória, Verdade e Justiça, criada durante o Encontro Unitário, que reuniu, em agosto deste ano, em Brasília, 37 entidades de camponeses, trabalhadores e militantes dos direitos humanos. 

No documento final do encontro, as entidades assumiram o compromisso de “lutar pelo reconhecimento da responsabilidade do Estado sobre a morte e desaparecimento forçado de camponeses, bem como os direitos de reparação aos seus familiares, com a criação de uma comissão camponesa pela anistia, memória, verdade e justiça para incidir nos trabalhos da Comissão Especial sobre mortos e desaparecidos políticos, visando a inclusão de todos afetados pela repressão”.

A Comissão, que conta com o apoio da SDH, já se reuniu duas vezes para definir os eixos de luta, buscando, inclusive, conhecer a experiência na reparação de camponeses pelas comissões da verdade de outros países. “Nos encontramos, por exemplo, com o ativista Eduardo Gonzalez, que foi membro da Comissão da Verdade do Peru, onde muitos camponeses foram reconhecidos como vítimas da ditadura”, conta Viana. 

A Comissão Camponesa já se reuniu também com membros da CNV, em especial a psicanalista Maria Rita Kehl, responsável pelo grupo de investigação dos crimes cometidos pela ditadura contra os camponeses.


Fotos: Concentração camponesa dirigida pelas Ligas Camponesas no Nordeste. 

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Políticos de toda região do Brasil possuem terras na Amazônia e Cerrado

Dados do livro “Partido da Terra – como os políticos conquistam o território brasileiro”, obtidos a partir de declarações de bens à Justiça Eleitoral, mostram que políticos de todas as regiões do país possuem terras na Amazônia e no Cerrado.

O jornalista Alceu Luís Castilho, autor do livro, lançamento recente da Editora Contexto, analisou quase 13 mil declarações de políticos eleitos em 2008 e 2010. No município de São Félix do Xingu (PA), o segundo maior do país, com o maior rebanho bovino, os políticos possuem mais de 12 mil hectares.
A reportagem é de Altino Machado e publicada por Terra Magazine / Blog da Amazônia, 24-09-2012.

O Pará é um dos principais destinos dos políticos – inclusive nos municípios do Arco do Desmatamento, no Pará e em Mato Grosso.

O livro expõe a tese de um “sistema político ruralista”, do qual emerge um fenômeno mais conhecido, a famosa bancada ruralista.

De acordo com o livro, entre os deputados estaduais e federais, senadores e governadores, eleitos em 2010 e 2006, de 548 mil hectares, 88 mil ficam em outros estados que não aqueles onde eles têm domicílio eleitoral.

Das áreas rurais declaradas pelos prefeitos, 22,56% também estão em outros estados. São 262 mil mil hectares, de um total de 1,16 milhão de hectares informados por eles ao TSE.

Dos 22 prefeitos do Acre eleitos em 2008, 10 são proprietários de terras rurais. Somando os vice-prefeitos, 13 municípios do Acre (59,09%) possuem políticos proprietários de terra à frente de prefeituras. A porcentagem entre os prefeitos é de 45,45%.

O estado que mais possui “prefeitos e vice-prefeitos com terra” é o Mato Grosso (com 62,41% entre prefeitos, 78,72% incluindo vice-prefeitos). Em seguida vêm ParanáBahia eEspírito Santo, contando os vice-prefeitos. Em todos estes estados mais de 70% dos municípios têm o prefeito ou o vice “com terra”.

Contando só os prefeitos a ordem muda: depois do Mato Grosso vêm Bahia (53,62%),Tocantins (53,24%), Rondônia (52,73%), Goiás (52,05%), Espírito Santo (51,95%) ePiauí (51,12%). Em todos estes casos mais da metade dos prefeitos é proprietária de terras rurais.

A lista dos 31 políticos com mais hectares, conforme as declarações entregues por eles mesmos à Justiça Eleitoral, possui um prefeito do Acre: Hilário Melo (PT), de Jordão. Ele declarou a posse de 17.842 hectares, em 2008, por R$ 42.942,87.

Uma das terras de Melo, de 17.731 hectares, foi declarada por R$ 642,87. A relação R$/hectare dessas terras é uma das mais baixas das 13 mil declarações analisadas: R$ 2,41 – equivalente ao preço de uma lata de cerveja.

Entre os latifúndios (pelo menos 2 mil hectares), essa proporção só é maior que a de uma fazenda do senador mato-grossense Jayme Campos, com relação R$/há de R$ 0,017.

A obra também enumera crimes ambientais em terras de políticos. Um dos casos é o do ex-prefeito eleito de Feijó, Juarez Leitão, do PT, afastado pela Justiça Eleitoral, que já teve obra embargada pelo Ibama, por desmatamento. Leitão era seringueiro, companheiro do sindicalista Chico Mendes e chegou a presidir o Conselho Nacional dos Seringueiros.

“Partido da Terra” traz também uma lista inédita de políticos madeireiros: são mais de 60 nomes. Quatro são do Pará, um do Amapá, um de Rondônia. Vários já foram acusados – alguns, até presos – de crimes ambientais.

Um dos capítulos sobre ambiente conta o caso de Luiz Augusto Ribeiro do Valle. Ele já foi diretor-presidente do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Acre. Teve uma área embargada pelo Ibama, em 2007, por destruição ou danificação de florestas.

Outro nome que aparece (sempre no 17º capítulo do livro, Arco do Desmatamento) é o deDarly Alves da Silva Filho, por desmatamento em Xapuri.

O livro trata também de crimes contra camponeses, indígenas e trabalhadores, a mando de políticos.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Adolescente sofre tentativa de homicídio após cobrar salário do patrão

Além de trabalhar em atividade irregular e de não receber o pagamento combinado, o adolescente Roberto*, de 15 anos, sofreu uma tentativa de homicídio em Xinguara (PA) depois de cobrar o patrão. Roberto ainda recebe ameaças e não tem proteção nenhuma do Estado.

Por Bianca Pyl, de Repórter Brasil
 
O adolescente trabalhou por um mês na propriedade do fazendeiro José Ferreira, conhecido na região como "Zé Mucura", com aplicação de agrotóxicos – atividade proibida para pessoas com menos de 18 anos e incluída na Lista de Piores Formas de Trabalho Infantil, oficializada por decreto presidencial assinado em 2008. Pessoas com menos de 16 anos, de acordo com a legislação brasileira, Roberto só poderia trabalhar como aprendiz, sob uma série de condições.
Roberto se apresentou para receber o pagamento combinado – R$ 3 por bomba de herbicida aplicado, ao final de 30 dias –, mas ouviu do proprietário que só receberia depois de uma semana. Ao cobrar o pagamento na semana seguinte, ele ouviu de José Ferreira que não receberia nada e que "levaria uma coça" se voltasse a falar no assunto.
Roberto, que estava alojado na propriedade, decidiu ir embora. No caminho de volta para casa, dois homens o agrediram com socos e chutes e o colocaram à força em uma caminhote. "Eles disseram que iam me matar e, pela conversa, eles eram da fazenda", contou o adolescente à Repórter Brasil.
Roberto conseguiu escapar porque pulou da caminhonete e foi socorrido por um motorista que passava pela Rodovia BR-155. Ele foi levado ao hospital da cidade, onde ficou internado por uma semana, e depois procurou a Comissão Pastoral da Terra (CPT) em Xinguara para denunciar o ocorrido.
O Conselho Tutelar do município de Xinguara (PA) também entrou no caso. "Nós acompanhamos a vítima até a delegacia para registrar um Boletim de Ocorrência. Os políciais chegaram a fazer uma vistoria na fazenda, mas não encontraram o dono", disse a conselheira Maria de Jesus Borges da Silva. 
Trabalho “desde novinho”
Por telefone, Roberto contou à Repórter Brasil que trabalha “desde novinho" e que não se lembra de quando usou uma enxada pela primeira vez. Ele estudou só até a 4ª série do ensino fundamental e é o caçula de quatro irmãos, que vivem todos com a mãe.
O jovem soube do trabalho na propriedade de José Ferreira por meio de um colega e foi sozinho até a fazenda, de bicicleta – percurso que dura aproximadamente duas horas. "Tinha o serviço, eu fui lá e comecei a trabalhar", contou.
Por conta da distância, Roberto ficava alojado na fazenda. Ele trabalhava das 7h às 18h e dormia na casa do vaqueiro. "Era uma casa boa. A comida também era boa, só a água que era ruim. Mas eu não tinha problema lá, podia sair se quisesse”, disse Roberto. O dono da fazenda, segundo ele, estava sempre por lá.

Ameaças
A agressão ocorreu em julho, mas o rapaz recebe ameaças até hoje, de acordo com a CPT. Desde que deixou o hospital, dois homens de moto e capacete rondam a casa de Roberto, segundo Nilson José de Souto Júnior, advogado da CPT. "Os homens chegam a ficar horas em frente à sua casa", confirma um relatório da comissão.
O adolescente relatou já ter ouvido um dos homens da moto dizendo "é aqui que mora aquele vagabundo, mais tarde voltamos para pegar ele". Acompanhado do advogado da CPT, Roberto registrou novo B.O na polícia.
Roberto também foi encaminhado para o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) para receber atendimento psicológico. Ele também poderá ser incluído no Programa para Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), do governo federal.
O Conselho Tutelar do município de Xinguara (PA) encaminhou um ofício para o Ministério Público Estadual (MPE) com um pedido de proteção ao jovem. A Repórter Brasil entrou em contato com o MPE, mas até o fechamento da reportagem não conseguiu um retorno sobre as providências tomadas em relação ao caso.

*nome fictício para proteger a identidade da vítima.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Trabalho é mais acessível para mulheres, mas em piores condições

Seminário internacional sobre economia feminista discutiu a situação do trabalho feminino profissional e doméstico 

Por Fernanda Sucupira

Nas últimas décadas, houve aumento significativo do emprego feminino remunerado praticamente no mundo todo, com pouquíssimas exceções. No entanto, as mulheres continuam recebendo menores salários que os homens, estão em empregos mais precários, encontram-se em maior número entre as pessoas desempregadas, trabalham mais em tempo parcial e continuam sendo as principais responsáveis pelo trabalho não-remunerado doméstico e familiar.
A atual configuração dos trabalhos das mulheres foi um dos temas discutidos no seminário internacional "Feminismo, economia e política: desafios e propostas para a igualdade e autonomia das mulheres", organizado pela Sempreviva Organização Feminista (SOF), de 28 a 30 de agosto, em São Paulo.
Polarização, precariedade e trabalho doméstico
Três aspectos caracterizam o trabalho assalariado das mulheres nos últimos vinte anos, segundo Helena Hirata, pesquisadora brasileira do Centro Nacional de Pesquisa Científica da Universidade de Paris VIII.
O primeiro deles é uma bipolarização do emprego feminino: de um lado, há uma minoria de mulheres com nível universitário, melhores salários e em ocupações de prestígio social, enquanto, de outro, existe uma imensa maioria de mulheres com trabalhos mal pagos, desvalorizados e sem reconhecimento social. Estes são empregos muitas vezes em tempo parcial ou de caráter temporário, quase sempre sem perspectiva de carreira.
A segunda característica é justamente a precarização do trabalho que, desde meados dos anos 1990, atinge mais as mulheres do que os homens. "Até que ponto a criação de um emprego ruim é uma coisa boa?", questiona Hirata. Segundo ela, há um paradoxo: mais mulheres estão no mercado de trabalho, mas em empregos mais vulneráveis a riscos e mais mal pagos que os oferecidos aos homens.
"Não existe nenhum país no mundo em que os salários femininos sejam maiores que os masculinos. Em todas as sociedades, os homens ganham mais que as mulheres, porque o trabalho masculino é considerado de maior valor", explica a pesquisadora. A valorização do trabalho masculino continua maior a despeito do fato de que, em todos os países industrializados, as mulheres já são mais escolarizadas do que os homens.
A terceira característica do emprego feminino é o desenvolvimento do trabalho de cuidado no mundo, sobretudo com a externalização do trabalho doméstico. Para serem autônomas, mulheres com trabalhos em tempo integral, nível superior e responsabilidades profissionais precisam de outras pessoas para fazer uma série de tarefas domésticas - e o trabalho doméstico é um dos maiores guetos femininos. Em países como o Brasil, a delegação do trabalho doméstico gera cifras enormes: o Censo de 2010 identifica que há cerca de sete milhões de trabalhadoras domésticas no país. É nelas que as profissionais prestigiadas se apoiam para se dedicar às suas próprias carreiras.
Uso desigual do tempo de trabalho
A tendência de aumento do trabalho profissional feminino não foi acompanhada por mudanças equivalentes na divisão sexual do trabalho em âmbito doméstico. As mulheres ainda dedicam muito mais tempo do que os homens a esses afazeres e são as principais responsáveis pela reprodução social da vida humana.
Em todo o mundo, pesquisas sobre o uso do tempo na vida cotidiana mostram tal desigualdade. De acordo com Antonella Picchio, pesquisadora da Universidade de Módena, reunindo os resultados de 14 países industrializados, observa-se que as mulheres gastam duas vezes mais tempo com trabalho doméstico ou familiar do que com trabalho remunerado. O quadro se inverte no caso dos homens, que usam 2/3 de seu tempo para trabalho remunerado e 1/3 para atividades não remuneradas.
"As políticas e incentivos para mudar essa configuração não têm muito sucesso porque essa é uma questão estrutural", analisa Picchio. "O problema em relação ao trabalho não remunerado é que ele não se dirige apenas às crianças, às pessoas doentes e aos idosos, mas também aos homens adultos, que precisam de muito cuidado. O mercado de trabalho não apenas exige que os homens não se ocupem das crianças e dos idosos, como também espera que não se ocupem de si mesmos, não reconheçam sua própria vulnerabilidade."
Ainda segundo Picchio, mulheres com filhos realizam menos trabalho não remunerado se estão sozinhas do que se estão vivendo com seus companheiros. Quando se forma um casal, em geral a mulher acaba fazendo o trabalho doméstico dos dois. "As mulheres precisam conectar o trabalho pago à vida. Isso é colocado como uma imperfeição das mulheres, mas o problema é do mercado que vê os indivíduos sem corpos, sem pessoas para sustentar", afirma a pesquisadora italiana.
No Brasil, um levantamento do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), da Secretaria de Políticas para as Mulheres e do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem), feito com dados da PNAD de 2007 mostra que as mulheres participam do trabalho doméstico em 90% dos domicílios brasileiros, enquanto a participação dos homens fica restrita a 50% das casas.
A participação masculina nos afazeres domésticos não é desprezível, mas, ao se analisar a média de horas dedicadas a essas atividades entre 2001 e 2007, nota-se que ainda consiste em uma participação bastante marginal. A dedicação média feminina teve uma pequena queda, de 29 horas em 2001 para 25 horas semanais em 2007; a masculina se manteve estável, sempre próxima a 10 horas semanais de trabalho não remunerado.
"As desigualdades muito marcadas no uso do tempo entre homens e mulheres têm impacto sobre a capacidade das mulheres de aceder a recursos, de conseguir trabalho remunerado, a capacidade de ser educada, de ser saudável, de se movimentar pelo território, de ter tempo livre. As desigualdades no uso do tempo são a matriz de muitas outras desigualdades", afirma Picchio. Ela defende uma redistribuição igualitária, entre homens e mulheres, dos recursos, dos trabalhos e das responsabilidades de cuidar de si mesmos e dos outros.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Grupo de Trabalho de se reune para aprofundar a Campanha da Fratrenidade de 2014.

O Grupo de Trabalho sobre o Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo (GT), e o Setor da Mobilidade Humana (SMH) da Comissão Episcopal Pastoral para o Serviço da Caridade, Justiça e Paz da CNBB se reuniram em Brasília, de 11 a 13 de setembro. O objetivo foi aprofundar a temática da Campanha da Fraternidade (CF), que em 2014 terá como tema “Fraternidade e o Tráfico humano”.

Durante o encontro, ocorre a coleta de informações e subsídios para a preparação da CF/2014, além da articulação de ações conjuntas entre o SMH e GT, no enfrentamento ao tráfico de pessoas e trabalho escravo. Entre os participantes do encontro, estão dom José Luiz Ferreira Salles, bispo de Pesqueira (PE), e dom Enemésio Angelo Lazzaris, bispo de Balsas (MA).
GTescravoepastoralsocial2012
Grupo de Trabalho do Tráfico Humano- CNBB Nacional

Os participantes já compartilharam no evento o andamento dos trabalhos realizados. Willian Cesar Andrade e frei Xavier, ambos membros do GT, fizeram uma exposição sobre as configurações do Tráfico de Pessoas e do Trabalho Escravo.  Houve também um painel sobre a realidade do Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo no Brasil.

Fazem parte do SMH os seguintes grupos: Apostolado do Mar, Pastoral Rodoviária, Pastoral dos Nômades, Pastoral do Turismo, Pastoral dos Refugiados, Núcleo dos Estudantes Internacionais, Pastorais das Migrações, Serviço Pastoral dos Migrantes, Pastoral Nipo-Brasileira e Missão Católica Polonesa.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Cerca de mil pessoas participam do 18º Grito dos/as excluídos/as de Teresina

Cerca de mil pessoas participaram da manifestação em comemoração ao 18º Grito dos Excluídos 2012.  O Grito se concentrou em frente ao Tribunal Regional Eleitoral e deslocou-se para a Avenida Frei Serafim e seguindo para a Marechal Castelo Branco onde caminharam no lado oposto ao desfile do 7 de Setembro. A manifestação teve a participação do  arcebispo de Teresina Dom Jacinto Furtado, que foi pessoalmente caminhar pelas ruas da capital.

Durante o desfile algumas pessoas estavam fantasiadas de ratos em um protesto contra a corrupção e reivindicando melhorias nas áreas da segurança, saúde, educação, saneamento básico, água, energia elétrica.
Uma das bandeiras lançadas durante o desfile foi a  denúncia de troca de votos por água no interior do Estado.  Os Integrantes do Grito dos Excluídos caminharam no lado oposto ao qual aconteceu o desfile do 7 de Setembro na Marechal Castelo Branco e pararam em frente ao palanque oficial onde estavam autoridades como o secretário estadual de Governo, Wilson Brandão, o secretário estadual de Fazenda, Silvano Alencar, o secretário municipal de Planejamento, João Alberto.



terça-feira, 4 de setembro de 2012

Desertificação já atinge 15%

 

 

JORNAL DIÁRIO DO NORDESTE

Nacional

Território brasileiro
03.09.2012
Brasília. Com aproximadamente 1,3 milhão de quilômetros quadrados do seu território sob risco de se transformar em deserto, pensar o uso correto da terra é cada vez mais urgente ao Brasil. Dados do Instituto Nacional do Semiárido (Insa), órgão ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, mostram que a área suscetível chega a 15% do território nacional e envolve 1.488 municípios em nove estados da Região Semiárida do Nordeste, do norte de Minas Gerais e do Espírito Santo.

De acordo com o coordenador da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), Naidison Batista, a conscientização dos agricultores sobre o manejo adequado da terra somada à difusão de tecnologias adaptadas ao Semiárido são elementos fundamentais para combater o processo de desertificação no País. Ele defende o uso das técnicas agroecológicas no combate e prevenção à desertificação. "O enfrentamento desse processo tem que ser feito por meio da prevenção e não remediando. E, nessa luta, a aplicação das práticas da agroecologia são fundamentais, porque elas preconizam o cuidado com a terra, a compreensão de que é preciso usufruir dela sem esgotá-la, sem objetivar apenas o lucro".

Ele acrescentou que a lógica do agronegócio, baseada na monocultura e no uso de agrotóxicos, contribui em grande parte para a degradação do solo, mas alertou que toda a humanidade é responsável por tentar conter esse processo. "O homem do campo tem que entender que suas práticas têm impacto sobre a natureza, mas o homem da cidade precisa saber que suas ações também têm consequências. É preciso não desperdiçar água em banhos demorados ou em lavagens prolongadas de carros, por exemplo".

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Deputado ruralista se choca com trabalho escravo no Pará


Ao acompanhar libertação de trabalho escravo contemporâneo no Sudeste do Pará, Giovanni Queiroz (PDT/PA) admite: "Nunca vi nada tão ridículo".
Por Bianca Pyl
"Pensei que não existisse mais isso no Brasil". Vinda do deputado federal Giovanni Queiroz (PDT/PA) - integrante da bancada ruralista, que costuma contestar a existência de trabalho escravo contemporâneo no país -, a declaração relativa à situação enfrentada por oito vítimas desta forma de exploração desumana no Sudeste do Pará ganha em consistência.

Junto com seus pares Cláudio Puty (PT/PA), Walter Feldman (PSDB/SP) e Ivan Valente (PSol/SP), respectivamente presidente, relator e membro da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Trabalho Escravo aberta no Congresso Nacional, o congressista acompanhou operação do grupo móvel de fiscalização e combate ao trabalho escravo realizada semana passada.

Grupo de trabalhadores estava alojado em barracos de lona e não recebia salários (Fotos: MTE)

O grupo foi resgatado na execução do chamado "roço de juquira" (abertura para a expansão da pastagem para atividade pecuária) da Fazenda Alô Brasil, que pertence a Luís Batista Mariano, localizada em Rio Preto, zona rural do município de Marabá (PA). A propriedade tem cerca de 500 alqueires (em torno de 1,2 mil hectares), com aproximadamente 800 cabeças de gado.

Composta também por integrantes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Polícia Federal (PF), a fiscalização encontrou trabalhadores em condições degradantes (alojados em barracos precários de lona e terra de chão batido, sem acesso à água potável, à alimentação adequada e à banheiro), sob isolamento geográfico, sem receber salários há dois meses, submetidos tanto à servidão por dívida e como a jornadas exaustivas do início da manhã até o anoitecer.

"Vimos uma situação vergonhosa, constrangedora. Nunca vi nada tão ridículo", descreveu o ruralista Giovanni Queiroz. De acordo com ele, o proprietário não tinha "nenhuma desculpa" para tratar os empregados de tal maneira, pois a fazenda era de meio porte, inclusive com "curral bem feito".

O deputado Cláudio Puty, que já acompanhou uma fiscalização de combate ao trabalho escravo urbano em São Paulo (SP), também ficou impressionado com o que viu. "Uma coisa é você saber o que é trabalho degradante pela letra da lei e outra é ver uma situação chocante como essa", avaliou.

Quadro
Foram cinco horas de estrada de terra até a fiscalização alcançar a fazenda. "O local é de difícil acesso e o povoado mais próximo fica a 30 quilômetros da fazenda", salientou Ivan Valente, outro parlamentar que esteve na operação, enfatizando o grau de dificuldade de acesso ao local.

Os regatados foram atraídos pela promessa de ganhar R$ 130 por alqueire convertido em pasto - o que, em média, levaria 15 dias. Contudo, o empregador não cumpriu a promessa. Há cerca de dois meses no local, tinham sido contemplados apenas com pequenos adiantamentos, que posteriormente seriam descontados de seus vencimentos. Sem salários, eles viam que dificultava ainda mais o deslocamento da Fazenda Alô Brasil.

Água usada era a mesma disponível ao gado; não havia sanitários e alimentação era escassa

A água consumida pelos resgatados - para tomar banho, matar a sede e cozinhar - era a mesma consumida pelo gado. As vítimas dormiam em barracas de lona abertas, sem nenhuma proteção. "Na região, o calor é intenso e, durante a noite, é muito frio. Os trabalhadores estavam expostos, ao relento", completou o experiente deputado do PSol.

Somente o vaqueiro dormia em um cômodo de alvenaria. Contudo, o local servia de depósito para agrotóxicos e combustível, entre outras coisas, e também estava em péssimas condições. Não havia instalações sanitárias no local, o que obrigava os empregados a utilizar o mato como banheiro.

A alimentação era preparada por um dos trabalhadores, que recebia um adiantamento e comprava a comida, que era escassa. A carne consumida pelos trabalhadores estava estragada, com moscas.

A jornada de trabalho era extensa, iniciando por volta das 6h30 até o anoitecer, de segunda à sábado. Aos domingos, os trabalhadores costumavam pescar para tentar compensarr a falta de comida à disposição. Por conta da distância e da falta de dinheiro, não saíam da propriedade.

Os auditores fiscais encontraram cadernos com anotações de dívidas referentes à compra de fumo, botas e sabonetes, entre outros itens. Ninguém tinha a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) preenchida. Conjuntos completos de Equipamentos de Proteção Indivual (EPIs) não eram fornecidos.

De acordo com o auditor fiscal Benedito de Lima e Silva Filho, coordenador da fiscalização, foram lavrados 12 autos de infração contra o empregador, que pagou as verbas rescisórias no total de R$ 25 mil.

Representado pelo procurador do trabalho Allan de Miranda Bruno na fiscalização, o MPT firmou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com os responsáveis pela área que prevê indenização de R$ 30 mil por danos morais coletivos e outros R$ 10 mil por danos morais individuais.

ComissãoNa visão de Benedito, a participação de congressistas na fiscalização ajuda a desmistificar as ações empreendidas contra esse tipo de crime. "Eu achei de suma importância a participação dos deputados nesta operação. Ao longo do tempo, quem não acompanha o combate ao trabalho escravo tende a não compreender a situação que relatamos. Alguns acham até que o grupo móvel exagera. Mas, nesta ocasião, os parlamentares puderam ver que os relatórios correspondem à realidade", avaliou Benedito, que tem mais de dez anos de experiência no combate ao trabalho escravo.

Para Ivan Valente, a presença de um integrante da bancada ruralista (Giovanni Queiroz) foi muito positiva para conferir in loco a situação em que brasileiras e brasileiros ainda vivem, que é a de "incontestável" escravidão contemporânea, "uma fotografia real do trabalho escravo".

O presidente da CPI, Cláudio Puty informou que apresentará proposta na próxima reunião administrativa da comissão, marcada para a próxima quarta-feira (05/09), solicitando que os proprietários autuados nas últimas fiscalizações rurais, incluindo Luís Batista Mariano, da Fazenda Alô Brasil, sejam convocados para prestar depoimentos aos parlamentares.

A Repórter Brasil não conseguiu contato com o proprietário para comentar o flagrante, que contou com presença dos deputados da CPI.