Sem equipamentos de proteção,
trabalhador cortou a própria perna. Ao todo, 15 foram resgatados em
condições degradantes em duas fazendas no Piauí
Por Anali Dupré
Na fazenda, não havia ambulância ou equipamentos de primeiros socorros. Trabalhador foi resgatado pela equipe móvel que fiscalizava o local. Foto: Divulgação/MTE |
Integrantes do Grupo
Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) presenciaram um acidente de
trabalho durante inspeção realizada em março nas Fazendas Boa Esperança e
Curralim, próximas ao município de Monte Alegre do Piauí, no Piauí,
onde foram libertadas 15 pessoas em condições análogas às de escravos.
Sem Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), um trabalhador perdeu o
controle da motosserra que utilizava e cortou a própria perna. Ele foi
socorrido pela equipe.
“Se nosso carro não estivesse lá, ele
estaria desamparado. No local não havia rede telefônica, nem mesmo um
carro do empreendimento para levá-lo ao hospital”, disse a auditora
Márcia Albernaz Miranda, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que
coordenou a ação. O trabalhador ferido socorrido pela equipe tem
deficiência auditiva, que, segundo a fiscalização, pode ter sido
provocada pela falta de protetores auriculares.
Trabalhador ferido |
Além
da ausência de equipamentos básicos de proteção, os fiscais
identificaram diversas outras irregularidades trabalhistas e condições
degradantes no desmatamento para abertura de pasto para gado. A extração
de madeira servia para produção de carvão. Ambas as propriedades eram
administradas por Vicente de Araújo Soares, arrendatário das fazendas.
À Repórter Brasil,
Vicente disse que desconhecia a necessidade de equipamentos de
segurança no uso da motosserra, afirmou já estar tomando providências
para sanar as irregularidades encontradas e procurou responsabilizar os
próprios trabalhadores pelas condições degradantes a que estavam
submetidos. Segundo o empregador, eles teriam se sujeitado a viver em
condições degradantes só para fazer a denúncia. "Foi por maldade de
alguns", garante.
Degradação humana
Os trabalhadores libertados foram encontrados em uma escola desativada, em alojamentos feitos de pau-a-pique e em barracos em péssimas condições. A escola era o único local que contava com banheiros, mas, como eles estavam sendo utilizados como depósitos, não podiam ser aproveitados. Sem instalações sanitárias apropriadas, nem mesmo fossas, os trabalhadores utilizavam as áreas externas ao redor dos alojamentos e baterias de forno como banheiro.
Os trabalhadores libertados foram encontrados em uma escola desativada, em alojamentos feitos de pau-a-pique e em barracos em péssimas condições. A escola era o único local que contava com banheiros, mas, como eles estavam sendo utilizados como depósitos, não podiam ser aproveitados. Sem instalações sanitárias apropriadas, nem mesmo fossas, os trabalhadores utilizavam as áreas externas ao redor dos alojamentos e baterias de forno como banheiro.
Monte Alegre do Piauí, onde foi feita a libertação |
Os
demais alojamentos feitos de pau-a-pique e os barracos improvisados não
possuíam portas ou janelas. Os trabalhadores estavam expostos a ataques
de insetos como escorpião, e a intempéries. Em sua defesa, o
empregador Vicente afirma que, na realidade, o alojamento designado por
ele para o grupo era a escola, que, segundo ele, apresentava espaço
suficiente para abrigar todos. Ele diz que, por vontade própria, os
resgatados haviam movido suas camas para locais sem condições. “Foram
uns três ou quatro que se mudaram e fizeram as denúncias contra mim",
afirmou, afirmando que sofreu uma "maldade".
Nas duas fazendas, a
água consumida era proveniente de um poço artesanal, sem qualquer
tratamento. Ela era armazenada em tambores plásticos reaproveitados, com
risco de contaminação. Assim como os trabalhadores que cortavam
árvores, os forneiros que trabalhavam na produção de carvão não tinham
acesso aos itens necessários para o desempenho seguro das atividades. Os
resgatados trabalhavam com capacete em vez do chapéu árabe recomendado,
e sem luvas e fardas. Os que operavam motoserra não contavam nem com
óculos de proteção, nem com calças de malha de ferro.
Ao todo nas
duas fazendas foram encontrados 28 trabalhadores sem registro na
Carteira de Trabalho. Além dos 15 resgatados, que receberam
seguro-desemprego, outros 5 pediram afastamento por falta grave
patronal, obtendo rescisão indireta. No total o empregador deverá pagar
R$ 50.000 de indenização por dano moral coletivo, além do valor das
verbas rescisórias. Ele prometeu regularizar a situação e ficou de
providenciar um novo alojamento.
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